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quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Vinho Velho, Garrafas Novas



Continuação da Teoria do Ginocentrismo

Por Adam Kostakis

Leitura n º 6

“O que esmaga a individualidade é o despotismo, seja lá o nome pelo qual isso possa ser chamado” — J.S. Mill 

Dominação. Muito da análise feminista gira em torno deste conceito. Um homem que bate em sua esposa não está apenas zangado com ela; ele está tentando dominá-la. Um homem que não concorda com uma mulher e discute com ela não está apenas sendo rude, ele está tentando dominá-la. Um estuprador não está realmente com vontade de fazer sexo; seu crime é uma demonstração de poder, ele só queria dominar a mulher.

Vejam vocês, o fato é que todos estes julgamentos absolutamente não são suficientes para aquelas que criticam fortemente o sexo masculino pelo mundo inteiro; pois elas sempre exigem mais combustível para a usina misândrica. Punir verdadeiros criminosos é uma coisa, mas isso, simplesmente, não é gratificante o suficiente para deixar como está — elas precisam articular o que sua “intuição feminina” sempre disse a elas, e vão para o ataque contra todos os homens. O problema, é claro, é que a grande maioria dos homens não ataca as mulheres de alguma forma perceptível qualquer. A solução, que feministas encontraram, é pegar o Dr. Freud e postular algo subconsciente, alguma motivação subjacente — uma mentalidade sombria, sexual, desviante e violenta, que atue como uma explicação universal para o comportamento masculino.

Vejam vocês, mesmo quando os homens não estão realmente envolvidos em atos criminosos, a criminalidade ainda está lá; ela está apenas latente — isso é o que as feministas querem nos fazer crer. A idéia de que todos os homens possuem um mal inerente e latente, e que as mulheres não, serve de útil cobertura para todo o discurso de ódio sexista contra os homens. Nós encontramos isso no esforço em diatribes sem sentido contra uma não-falseável “cultura do estupro”, em campanhas para proibir o consumo privado de pornografia, e na apologia a mulheres mal-intencionadas que falsamente acusam os homens de crimes sexuais. Considere esta declaração de Mary Koss: “O estupro representa um comportamento extremo, mas é aquele que está em um continuum, com o usual comportamento masculino dentro da cultura”.

O inerente comportamento desviante masculino, é assim que elas dizem (ou insinuam), manifesta-se como um continuum de masculinidade disfuncional, cobrindo tudo, desde um simples desentendimento verbal, evoluindo até o assassinato de um cônjuge. Todos os atos masculinos que não contribuem para o projeto feminista — ampliar o poder das mulheres — estão a ser tomados como prova de uma inata masculinidade viciada, que buscaria, acima de tudo, dominar o belo sexo.

Coloque da seguinte forma: Você diria que o fato de se ser assassinado ajudaria a aumentar o poder de uma mulher?

Não?

Bem, o que dizer então de perder uma discussão verbal — isso ajuda a aumentar o poder dela? Ou não? Certamente, ela vai aparentar ter maior autonomia se puder mais facilmente convencer os outros de que sua visão é a correta.

Assim, se ambos os exemplos acima existem em um continuum de perda do poder das mulheres, cujo corolário é a dominação patriarcal, então, naturalmente os homens são os culpados. Isto é, se nossa análise estiver baseada em suposições duvidosas, feministas.

O conceito de dominação, assim dado como certo em sua forma atual, é um exemplo supremo de mudança linguística a qual eu havia discutido anteriormente. Como um termo, ele carrega um contrabando ideológico, escamoteado numa túnica de justiça. Originalmente, o termo dominação, que tem sua raiz no Latim dominus, referia-se especificamente ao poder exercido por um senhor de escravos. Como tantos outros termos que as feministas aproveitaram a fim de manipular a percepção da realidade, a dominação tornou-se um objeto de branqueamento semântico.


O que realmente é interessante nisso tudo, é que o nosso novo conceito de dominação — como hierarquia injusta, a ser combatida e atacada — tem sido utilizada em um sentido específico: como um patrocinador para o verdadeiro despotismo. O sinal de perigo mais óbvio que marca o caminho para o governo despótico é a invasão da esfera pública na vida privada dos indivíduos. O despotismo é precisamente o tipo de hierarquia injusta com os quais nós identificamos a dominação; mas, se o último termo é suficientemente ampliado, para abranger todos os domínios da vida privada, então uma ditadura esmagadora e brutal é o resultado inevitável.

Este é o contexto em que devemos entender o slogan feminista que teve o maior poder de permanência: o pessoal é político. Note que (de acordo com o slogan), o pessoal não é apenas uma questão de interesse ao político; não faz parte do político; não é de importância equivalente ao político. Na verdade, é o político. Os dois termos são apresentados como se eles fossem idênticos e intercambiáveis.

O pessoal é político.

Se isso é verdade, então não existe o menor espaço de privacidade, o que é um problema para cada indivíduo isoladamente — isto é, sobre o qual o indivíduo é soberano. É bem verdade que uma vida privada não valeria a pena e não seria possível sem uma estrutura pública abrangente — é a lei que protege todas as liberdades que tornam possíveis a vida privada e os interesses. Usando a analogia favorita de J. F. Stephen, a lei é o tubo por meio do qual as águas fluem livremente. É quando a vida pública — o Estado — não consegue reconhecer seus próprios limites, que a sociedade torna-se ameaçada pelo governo despótico.

Intelectuais de todas as épocas aparecem com as mais engenhosas das razões de porque seus modos de pensar são superiores a tudo o que passou anteriormente. A maioria das pessoas simplesmente tem assumido isso sem a necessidade de qualquer justificativa. O que é tipicamente moderna é a construção de fronteiras artificiais entre o nosso tempo e épocas passadas. Nós, por exemplo, não nos consideramos a viver no mesmo plano histórico, como o da Europa Medieval, muito menos o da Grécia Antiga. Estes são tempos inexplicáveis e inacessíveis para nós. Trata-se de uma fantasia sedutora explicar todos os medos evocados pelos horrores dos livros de história. Nós gostamos de acreditar que autocracias sangrentas irão, seguramente, se limitar a aquelas páginas, e que tais coisas não poderiam acontecer aqui, não agora; não na vida real. Certamente, nós já estamos além de tudo aquilo. Nós somos iluminados, ao contrário dos seres humanos que existiram antes de nós.

Mas não estamos no mesmo plano histórico que deu origem ao Comunismo Soviético e ao Partido Nazista? Estes reinados particulares de terror ocorreram no último século, não importa o quanto gostemos de pensar em nós mesmos como evoluídos para além de tais barbáries. Supostamente, nós no mundo Ocidental abominamos os regimes totalitários, e no entanto, a ascensão dos dois regimes mencionados anteriormente é o indicativo de uma tendência existente no seio da nossa cultura política. No meio da bagagem que herdamos do Iluminismo temos o conceito de utopia. O termo foi criado no século XVI, e é designada, pela primeira vez, a noção de uma ordem sócio-política perfeita. Com o nascimento desta idéia, as sementes foram semeadas para a limpeza de impedimentos humanos como um programa político operacionalizado.


Antes do Iluminismo, a vida humana era essencialmente assumida a ser cíclica. Tão certo quanto o sol nascer pela manhã e se pôr mais uma vez à noite, e poderes tão grandes ascenderem e declinarem, apenas para os mais novos tomarem o seu lugar. Tal era a ciência de Polybius, cujas obras históricas não dispunham eventos em ordem cronológica, mas que apresentavam a experiência humana como uma unidade. Dinastias, impérios, culturas, pessoas e suas comunidades nasciam e morriam nas oscilações do pêndulo cósmico.

Uma das grandes inovações conceituais da modernidade é o progresso como o ideal orientador na política e na sociedade. Não apenas assumimos que estamos constantemente mudando nossa própria história; a crença persiste que tudo é apenas questão de tempo para que cada problema tenha uma solução. A fé no conhecimento humano nunca foi tão grande quanto agora na Era da Informação; nós buscamos ativamente superar o que por muito tempo eram considerados fatos insolúveis da vida.

O propósito dessa digressão não é lançar dúvidas sobre as possibilidades do conhecimento humano, nem sugerir que uma tentativa de melhorar a condição humana seja uma busca ignóbil. É salientar que somos todos filhos do Iluminismo, independente de qual espectro político possamos cair. É salientar que existem determinados pressupostos peculiares, que formam a base e os andaimes do pensamento político ocidental, e é sobre estes pressupostos que ideologias tão diversas como o conservadorismo, o liberalismo, o nacional-socialismo e o feminismo são construídos.

O –ismo em si é um fenômeno totalmente moderno. Um ismo (ou poderíamos dizer, uma “ideologia”) assume uma diferença entre como a sociedade é e como ela deveria ser, pautada numa visão moral específica do mundo. Isto é obviamente verdadeiro para aquelas ideologias que defendem explicitamente a mudança — o socialismo, o liberalismo, o feminismo, e assim por diante. Isso é verdade para o conservadorismo e o tradicionalismo também, ideologias que (como se vê) pretendem ressuscitar o bebê que foi jogado fora junto com a água do banho dos séculos.

Normalmente, o que os ideólogos acham tão censurável sobre o mundo é sua existente configuração de poder. Os grandes textos e articuladores da ideologia descrevem uma configuração de poder, argumentam para seu reconhecimento sobre a injustiça, e em seguida, apresentam os meios para alcançar a mudança desejada. Os meios podem envolver um trabalho por meio das existentes instituições do Estado, ou eles podem exigir sua derrocada, ou podem evitar práticas tradicionais de uma maneira geral e defender a magia do trabalho deles por meio da sociedade civil.

Qualquer que seja a ideologia implicada na prática, essa é uma diferença marcante do que se passou anteriormente. É o progresso, não a repetição, a raiz de toda a expectativa política. Se é um progresso em direção a uma sociedade sem classes, ou à pureza étnica, ou para o retorno de virtudes tradicionais, o progresso é a constante. A visão de que algo está errado e que algo precisa ser feito a esse respeito, como uma declaração política, é uma invenção recente, a qual define a nossa cultura política comum. Os conservadores são apanhados na mesma teia “progressista”, como também assim são os iconoclastas, que sinalizam a sua conformidade com os modos convencionais de pensamento ao mesmo tempo em que afirmam as suas intenções para o rompimento. Quanto mais eles lutam contra essa inevitabilidade, mais presos se encontram. Para dar um exemplo relevante, às vezes as feministas têm declarado que elas estão se afastando de pressupostos completamente “patriarcais”, e construindo a sua própria visão de mundo a partir do zero, totalmente não-viciada pela influência masculina. Na verdade, ninguém começa do zero, e o feminismo permanece profundamente enraizado nos modos de pensamento que evoluíram ao longo de séculos, exclusivamente através da mente dos homens. A ideologia feminista, e todas as suas inovações, simplesmente não ocorreram previamente sem séculos de trabalho feito por homens.

A leitura da próxima semana terá um olhar mais atento na afirmação feminista de que o pessoal é político, e as implicações ocultas contidas neste slogan. Nas semanas que se seguem, vamos considerar o conceito de utopia, que foi mencionado apenas de passagem aqui. Um breve comentário aqui será o suficiente: a utopia é a extensão lógica de progresso, na medida em que é o fim de todo o progresso, o estágio final da existência humana. É uma idéia profundamente perigosa, responsável pelos regimes mais opressivos e pelas revoluções mais sangrentas que o mundo já conheceu. Enquanto o poder e a glória pessoais podem ter sido a força motivadora por trás das ações dos indivíduos despóticos ainda na memória recente, foi uma visão coletiva e utópica que despertou seus seguidores a manifestar a mais violenta das fantasias. Em todos os casos onde utópicos pegam as rédeas do poder, os seres humanos que não se encaixam em sua visão de uma nova ordem mundial são tratados como lixo vivo de um regime desbotado.

É com repulsa e horror que o Ocidente olha para trás os déspotas utópicos do século XX, e ainda estes despotismos particulares correspondem a uma tendência que forma a infra-estrutura de nossa própria política. A repulsa e o horror são suficientemente reais, porém, e talvez, a maior mudança verdadeiramente progressiva nos últimos tempos seja a rejeição do extremismo, em todas as suas formas, por populações determinadas a deixarem para trás o século do genocídio.


Só que não é tão simples. Você pode puxar as partes de cima, e arrancar os caules limpos da terra, mas a menos que você desenterre as raízes, você vai encontrar essas flores brotando novamente antes do tempo. O utopismo, com a limpeza de impedimentos humanos que sempre acarreta, está codificado em nosso DNA político. A repulsa generalizada aos totalitarismos recentes e fracassados não irá fazer isso ir embora, só pode fazer a tendência despótica cair em silêncio por pouco tempo. Um novo despotismo só pode emergir se ele faz isso silenciosamente, disfarçado como algo completamente diferente — talvez como oposição organizada a certas formas de dominação injusta, a solução pela qual é sempre aumentar o poder do Estado em relação à autonomia do indivíduo.

O pessoal é político, dizem as feministas.

Já posso ouvir os passos de ganso* se aproximando.

Adam

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Notas do Tradutor:
passos de ganso eram uma forma especial de marchar com as pernas levantadas e retas. Os soldados de Hitler costumavam a marchar dessa forma.
E como eu já afirmei anteriormente, ainda continuo escrevendo seguindo a “antiga” Ortografia Brasileira.

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KOSTAKIS, Adam. Vinho Velho, Garrafas Novas [Old Wine, New Bottles] [em linha]. Tradução e notas de Charlton Heslich Hauer. [S.l.]: Gynocentrism Theory, 2011. Disponível em: <http://gynotheory.blogspot.com/2011/02/old-wine-new-bottles.html>. Acesso em 31 out. 2012.

Atualizada e revisada em: 30 dez. 2018.

Clique aqui para ler o 7º artigo sobre a Teoria do Ginocentrismo